sábado, 4 de julho de 2015

Processos contra a imprensa levam a autocensura e inibem jornalismo investigativo

Por Juliana Domingos de Lima

Crédito: Camila Alvarenga
O hábito de processar a imprensa leva a autocensura, inibe o jornalismo investigativo e prejudica a liberdade de expressão. Com a internet, as pessoas "perderam" o direito de serem esquecidas. As redes sociais e as matérias publicadas nos sites mantêm indefinidamente o registro de casos que podem constrangê-las. Essa perenidade do conteúdo online fez aumentar as ações judiciais contra jornalistas nos últimos anos.

De acordo com Tiago Mali, jornalista da Abraji, as pessoas passaram a recorrer cada vez mais à justiça para remover notícias que ainda impactam negativamente suas vidas.

O cenário pode parecer ruim para os jornalistas. Mas, de acordo com a advogada Taís Gasparian, houve uma evolução nas últimas décadas. Há 23 anos trabalhando pela defesa de veículos como Folha de S.Paulo, UOL, Terra, O Globo e Carta Capital, Taís se mostra otimista. "Apesar das tentativas em contrário, acho que o Brasil está em um bom caminho", diz.

A advogada, no entanto, chamou atenção à mudança ocorrida em 1999 na Justiça brasileira, na qual a responsabilidade passa a ser também do jornalista, não só do veículo. Isso fez com que o autor da notícia começasse a carregar processos, que podem configurar assédio judicial e intimidação. Mali aponta que, nesse contexto, com medo das retaliações, não raro o jornalista passa a se autocensurar.

Ferramenta de controle social do cerceamento judicial contra jornalistas apresentada por Mali, o CTRL+X é um serviço da Abraji que mapeia pedidos de remoção de conteúdo. Iniciado durante as eleições de 2014, chamado então Eleição Transparente, o banco de dados tinha como objetivo verificar os candidatos que defendiam a liberdade de expressão mas, ao mesmo tempo, entram com processos para a remoção de conteúdo. O banco de dados, que atualmente abrange o período entre julho e outubro do ano passado, reuniu 192 ações na justiça e está sendo ampliado para possibilitar a consulta dos atores que mais processam jornalistas, mostrando suas principais alegações, as unidades federativas com mais ações, veículos mais processados e ainda períodos que concentram um pico maior de ações judiciais contra a imprensa.

Além de acompanhar quem processa, a mesa também deu dicas de como evitar os processos. Taís explica que o tempo de prescrição no Código Civil é de três anos e recomenda certos cuidados durante esse período. É fundamental guardar, de forma organizada, todas as gravações, entrevistas, telefonemas, documentos e fotografias. Esclarece também que, segundo o Marco Civil da Internet, vigente desde abril de 2014, o conteúdo online só deve ser removido com ordem judicial, o que significa que o jornalista não é obrigado a tirar seu conteúdo do ar logo que haja pedido de remoção.

A advogada reforça os cuidados nas matérias com crianças e adolescentes - nesses casos, recomenda "pensar três vezes antes de publicar", lembrando que está vedada a divulgação dos delitos cometidos por menores e sua identidade, fotografá-los, citar nomes ou iniciais, filiação e residência. Proteção prevista no artigo 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, sua violação pode suspender a programação da emissora por até dois dias ou suspender a publicação de uma revista ou de um jornal por até dois números. Enfatiza, ainda, que é importante pedir documentos para confirmar a idade dos entrevistados e fotografados. "O Brasil não tinha cultura de liberdade de expressão, mas está melhorando. Acho que ela deve ser completa e que depois, se necessário, deve-se responder aos danos", opina.

O 10º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo é uma realização da Abraji e da Universidade Anhembi Morumbi com o patrocínio do Google, O Globo, Estadão, Folha de S. Paulo, Gol, Itaú, Oi, TAM, Twitter e UOL, e apoio da ABERT (Associação Brasileira de Rádio e Televisão), ANJ (Associação Nacional de Jornais), Comunique-se, Conspiração, Consulado Geral dos Estados Unidos no Brasil, FAAP, Fórum de Direitos de Acesso à Informações Públicas, Jornalistas & Cia., Knight Center for Journalism in the Americas, OBORÉ Projetos Especiais, Textual e UNESCO. Desde sua 5ª edição, a cobertura oficial é realizada por estudantes do Repórter do Futuro, sob a tutela de coordenadores do Projeto e diretores da Abraji.




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