sexta-feira, 3 de julho de 2015

Gaspari diz que imprensa 'comeu bola' no Fies

Por Karine Seimoha

Foto: Bruno Martins
Elio Gaspari, colunista da Folha de S.Paulo, veio hoje ao 10º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, em São Paulo, para falar de uma não-notícia: as mudanças do Financiamento Estudantil (Fies) ocorridas em 2010. Para ele, os jornalistas demoraram para perceber indícios de irregularidade no programa que custeia o estudo de milhares de jovens no Brasil.

Gaspari explicou que em 2010, Fernando Haddad, então ministro da Educação, anunciou uma série de alterações no Fies, que incluíam a possibilidade de um aluno que tinha zerado a redação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) conseguir um financiamento. Pouco tempos após o anúncio das mudanças, em março do mesmo ano, o número de estudantes do Fies teve um crescimento de 485%, alcançando a marca dos 827 mil alunos. Desta forma, ⅓ dos estudantes das instituições privadas do país eram advindos do programa.

Em abril de 2010, Samuel Pessoa, economista tido como conservador, fez comentários elogiosos ao programa de acesso a educação. Ainda em 2010, desta vez no mês de setembro, o Banco Morgan fez a previsão, que viria a se concretizar apenas cinco anos depois: o dinheiro investido não retornaria aos cofres públicos.

A explicação para esse fato é relativamente simples. Segundo Gaspari, "com o Fies, as universidades privadas se livraram das mensalidades, pois transferiram o custo da mantenedora para a 'conta da viúva' (governo federal). Assim, segundo ele, "o programa deixou de ser um problema de Educação e passou a ser um problema de Economia".

A partir disso, as pautas relacionadas ao programa de financiamento de estudos migraram das editorias de educação e passaram a integrar os cadernos de economia sob duas possíveis perspectivas: os rombos nos cofres públicos e os "falsos problemas", que são, no fundo, uma crítica ao Ministério da Educação (MEC).

"Cobrir educação no MEC é como cobrir saúde no Ministério da Saúde. Simplesmente não funciona! O Ministério da Saúde funciona para campanhas de vacinação, não para hospitais. Cobrir um hospital que funciona é o Hospital do Capão Grande, é o Sírio [Libânes], é o [Albert] Einstein." E completou, "mais grave que isso é receber um press release do Fies e não perceber que aquilo é maluquice".

José Roberto de Toledo, colunista d'O Estado de S. Paulo e mediador da mesa, afirmou que, após levantamento feito pelo Estadão, verificou-se que algumas empresas de ensino receberam, em 2014, mais verba do governo que os empreiteiros presos na Operação Lava Jato. Corroborou a tese de Gaspari sobre a possível explicação para o não-crescimento do número de alunos na rede privada de ensino superior, "os alunos apenas migraram".

Paralelamente a isso, observou-se que o valor das mensalidades de tais instituições de ensino aumentou, bem como os valores das ações dos grupos aos quais pertencem as instituições. Após a publicação da matéria, Toledo afirmou que os valores relativos às ações da bolsa dessas empresas tiveram uma queda significativa.

Toledo ainda acrescentou que após a campanha presidencial e a reeleição, a presidente Dilma Rousseff (PT) assumiu que as modificações ocorridas no Fies em 2010 foram um grande erro do governo petista.

Ao final da mesa, Gaspari respondeu a pergunta com a qual abriu o debate: "tudo do Kennedy aconteceu em meia hora. Levamos cinco anos para descobrir uma mudança feita em 2010. Isso é uma maluquice!"

O 10º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo é uma realização da Abraji e da Universidade Anhembi Morumbi com o patrocínio do Google, O Globo, Estadão, Folha de S. Paulo, Gol, Itaú, Oi, TAM, Twitter e UOL, e apoio da ABERT (Associação Brasileira de Rádio e Televisão), ANJ (Associação Nacional de Jornais), Comunique-se, Conspiração, Consulado Geral dos Estados Unidos no Brasil, FAAP, Fórum de Direitos de Acesso à Informações Públicas, Jornalistas & Cia., Knight Center for Journalism in the Americas, OBORÉ Projetos Especiais, Textual e UNESCO. Desde sua 5ª edição, a cobertura oficial é realizada por estudantes do Repórter do Futuro, sob a tutela de coordenadores do Projeto e diretores da Abraji.

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